segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Pausa

O Falta Dizer faz uma pausa para Natal e Ano Novo.
Retorna com novos posts em 3 de janeiro de 2011.
Boas Festas!

domingo, 19 de dezembro de 2010

Outra régua pra medir a desregulamentação

É curioso que o governo Lula tenha arengado tanto contra a "era da desregulamentação".
Ora, a "era da desregulamentação" é uma das responsáveis pela "era Lula".
Foi na "era da desregulamentação" que o volume do crédito mundial cresceu enormemente.
Parte desse crédito foi parar em mãos brasileiras, incluídas aí as mãos da nossa nova classe média, a classe C.
Foi na "era da desregulamentação" que, em boa parte do mundo, os investimentos produtivos e a produtividade do trabalho se elevaram acentuadamente.
Foi na "era da desregulamentação" que o comércio mundial atingiu níveis extraordinários.
Tudo isso favoreceu o Brasil, que passou a contar com compradores vorazes de nossas commodities.
Foi na "era da desregulamentação" que o governo de FHC domou a inflação e, seguindo algumas orientações do chamado Consenso de Washington, avançou no saneamento de nossas finanças e na regulamentação do sistema bancário, o que contribuiu muito para que o Brasil atravessasse a crise de 2008/2009 sem pânico, embora com perdas importantes.
Isso quer dizer que o governo Lula foi agraciado com o melhor de dois mundos: o descomunal dinamismo da economia mundial até 2007/2008 e as rédeas curtas da prudência monetária e fiscal, herdadas dos anos FHC.
Assim, o mix de desregulamentação externa/regulamentação interna, que caracterizou a "era da desregulamentação", fornece boa parte da explicação dos êxitos socioeconômicos da "era Lula", embora esta também tenha méritos próprios.
Lula, em vez de arengar, deveria, ao lado dos brindes que ergue a si próprio, erguer um brinde aos Estados Unidos, grandes heróis/vilões da desregulamentação no plano externo; e outro a FHC, grande artífice da regulamentação interna.
E, pra você, o que falta dizer?

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Não fui eu que disse

Reproduzo abaixo artigo de João Basílio Pereima sobre independência do BC, publicado no Valor de hoje.


A política monetária e os instrumentos múltiplos



Quando se fala em independência da autoridade monetária, deveríamos nos referir a independência nos dois sentidos e não apenas em relação ao uso político, como tem sido a ênfase até o momento. Isso ficou evidente, mais uma vez, com os recentes aumentos na taxa de inflação e com a pressão para elevação de juros.

Há dois pontos importantes que merecem ser discutidos: a urgência em elevar juros, bem como a própria escolha da taxa como único instrumento de combate à inflação. O modo como o Banco Central se comportará em relação aos dois pontos definirá doravante sua tão propalada independência.

No que se refere à urgência, pode-se argumentar o seguinte. A inflação de novembro, medida pela IPCA, acusou variação de 0,83% no mês. Por um lado, é preocupante, pois o resultado de novembro completa cinco meses consecutivos de aceleração inflacionária, fato este que não ocorre desde a implantação do sistema de metas em 1999. Ocorreram vários episódios de três meses consecutivos de aceleração abortadas no quarto mês com desaceleração, mas nunca um de cinco.

Enquanto o fator tendência reclama urgência na reação da autoridade monetária e exige aumento de juros já, tornando-o um fato consumado na próxima reunião do Copom, os fatores sazonalidade e localização recomendam prudência e relativizam o senso da urgência, no que fez bem o BC em manter a luz vermelha acesa e a taxa de juros constante, não fazendo nada por ora. O horizonte temporal de manobra da política monetária é maior do que creem os alarmistas. Ceder aos apelos da urgência é reduzir a independência e cair cativo de um grupo de pressão.Por outro lado, a inflação no Brasil possui componente sazonal elevado com costumeira aceleração nos meses de outubro, novembro e dezembro. Além disso, no caso de novembro último, somente o item carnes, que tem um elevado peso de 2,38 pontos na composição final do IPCA, aumentou 10,7% dentro do mês. Outro item com peso relativamente alto de 0,84 ponto é o açúcar, cuja inflação no mês foi de 5,01%. Juntos estes dois itens representam 0,30 ponto percentual do total de 0,83%.

A segunda questão importante doravante é o uso da taxa básica de juro como instrumento privilegiado na política monetária. A afirmação corrente de que inflação deve ser combatida com aumento juro está correta. O que está errado é afirmar que é somente isso que o Banco Central sabe e deve fazer. É como se após quase um século de ciência monetária, só conseguíssemos desenvolver uma tecnologia de intervenção baseada numa versão qualquer da regra de Taylor para política monetária. Os modelos macroeconômicos fazem isso por questão de simplicidade algébrica e para isolar canais. Modelos mais completos quando vertidos para versões simuláveis tornam-se tão indecifráveis quanto a própria realidade e perdem sua razão de ser: explicar muito com pouco. Disto não se segue que possamos sair por ai pregando aumento e baixa de juro como quem prega a palavra de Deus gritando ao vento.

Existem vários problemas no uso da taxa de juro como instrumento único. Primeiro o fato de que o efeito é decrescente e não linear. Partir de uma taxa de juros baixa e aumentá-la tem um efeito muito maior na inflação e expectativas do que partir de uma taxa elevada e aumentá-la ainda mais. Em segundo lugar, o uso cego e independente da taxa juros pode entrar em contradição com outras políticas macroeconômicas com resultado final nulo, de forma que o mais recomendado é coordenação de políticas e não competição. Em terceiro lugar há outros instrumentos monetários, que estão começando a ser usados pelo Banco Central e que o falso consenso macroeconômico dos anos 1990 e 2000 relegou a segundo plano, que são as políticas de redução de prazos de financiamento, redução de liquidez bancária, graus de alavancagem de operações e exposição de risco de carteiras. É claro que o setor financeiro não gosta de regulação, pois isso diminui o volume de operações. Mas não está no seu escopo e DNA pensar no todo. O quarto e último motivo é que o uso da taxa de juro, num contexto de economia aberta e mobilidade de capitais, pode causar sérios desequilíbrios em outros setores e mercados. Esta aí o câmbio sobrevalorizado, por conta de um longo período de desrespeito à paridade descoberta da taxa de juros. Não bastasse o Brasil ter a maior taxa real de juro do mundo, ele teria que aumentá-la ainda mais para evitar inflação. As consequências serão fomentar o já gigantesco "carry trade" que o aumento de IOF mal consegue deter. Aumentar o juro interno, num momento em que o mundo inteiro desvaloriza suas moedas para estimular exportações e crescer, é expor uma economia inteira às consequências de um câmbio valorizado, por conta de uma política monetária de um instrumento só.

Só um Banco Central independente de todos terá a liberdade necessária para levar em conta estas questões. Agirá muito bem o próximo governo se sua política for a de estender a independência do Banco Central para todos os segmentos da sociedade, de tal que forma que os formuladores de política econômica compreendam o momento adequado de usar coordenação macroeconômica e diferentes instrumentos de política monetária e não apenas um só. É um bom primeiro passo para se começar a reduzir os juros, ao invés de aumentá-los.

João Basilio Pereima é professor e vice-chefe do Departamento de Economia Universidade Federal do Paraná (UFPR). joaobasilio@ufpr.br

Não fui eu que disse

Reproduzo a seguir artigo bastante ponderado, publicado originalmente na Folha de hoje, sobre tendências do poder global.
O autor se distancia de avaliações, simplistas a meu ver, que apontam para o declínio do poder americano.

Predomínio ocidental está longe do fim 

MARCELO COUTINHO




Com a ascensão chinesa, muitos começam a diagnosticar a erosão do Ocidente na ordem internacional. Embora correta, é preciso qualificar a interpretação de que o mundo oriental emergente desloca o polo de poder. O sistema contemporâneo está se voltando na verdade para o Pacífico, e nada poderia ser pior para o Brasil.
Até o século 19, o sistema interestatal esteve na Europa. Após as duas Grandes Guerras, o poder atravessou o oceano Atlântico, partindo de Londres para a terra de Wilson e Roosevelt.
Durante a Guerra Fria, a ameaça soviética uniu o Ocidente na forma da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). A divisão Leste-Oeste só acabaria com o fim do bloco socialista, consagrando a hegemonia ocidental.
As divergências no Ocidente sempre existiram, e a crise de Suez em 1956 abriu uma fissura entre europeus e norte-americanos. A Inglaterra subordinou-se à antiga colônia, enquanto a França de Charles de Gaulle ensaiou um projeto mais autônomo com a Alemanha.
Sarkozy levou os franceses de volta ao comando militar da Otan.
O Ocidente se reunificou do ponto de vista político, mas enfrenta uma grave crise econômica. É nítido o declínio das economias ocidentais diante dos países emergentes, que já respondem por metade do PIB e da produção mundial. Tais avanços econômicos podem se transformar em poder político.
No entanto, nada assegura um colapso inevitável do Ocidente: para sair de cena, seria necessário que nações como a China exercessem predomínio não só econômico, mas também político e cultural, o que não parece acontecer. Há décadas os países asiáticos implementam reformas voltadas para o Ocidente.
O centro do poder, na realidade, muda neste momento para o Pacífico, incluindo os EUA, dando continuidade ao movimento anti-horário que começou na travessia do Atlântico. Isso significa que a cooperação econômica da Ásia e do Pacífico (Apec) deve se tornar a organização regional mais importante do mundo, com a maior área de livre-comércio.
Os EUA seriam o fiel da balança entre um Oriente que sobe e uma Europa que desce. Situados entre oceanos e líderes da Otan e da Apec, os EUA seriam o entreposto de mercados e o principal avalista da segurança internacional.
Nesse caso, a hipótese de choque das civilizações de Huntington não poderia estar mais enganada, assim como os prognósticos sobre o crepúsculo americano.
No espaço de influência direta dos EUA no hemisfério Ocidental, o Brasil enfrenta grandes desafios diante das mudanças globais.
A Unasul é tenra flor, rodeada pela 4ª Frota e atraída pelo comércio no Pacífico, o que compromete os planos brasileiros de cooperação regional autônoma e de desenvolvimento industrial.
O fim do Ocidente pode não estar próximo: depois da crise, pode vir um novo ciclo inesperado de crescimento. Isso abriria os caminhos do Brasil. Mas, se a economia mundial perder mesmo dinamismo e se alojar definitivamente em mares distantes, teremos que nos adaptar, a um preço alto.


MARCELO COUTINHO é professor de relações internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Laboratório de Estudos da América Latina (Leal).

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Ministério sem mistério

Houve quem celebrasse a previsibilidade das indicações ministeriais como uma conquista da democracia.
Compreendo o argumento e sei que previsibilidade e governabilidade se encontram.
No entanto, a previsibilidade de Dilma contém um outro aspecto, relacionado às baixas expectativas que, me parece, o país deve ter deste governo.
Foi essa, inclusive, uma das razões do meu voto nulo, porque eu tenho pra mim que Dilma será uma marcadora de passo.
E o Brasil merece algo maior e melhor.
Pensei em fazer uma análise nome a nome dos novos ministros, mas não vale a pena.
Em boa parte dos casos, seria o equivalente a comparar um grão de arroz com outro grão de arroz.
É claro que há uns poucos nomes de quem se pode esperar algo interessante.
Mas, para mim, o que sobressai é a pequena capacidade de realização, quantitativa e qualitativa, do novo governo.
Sobressai também a pequena capacidade de autodefesa pública de Dilma e dos integrantes do novo governo.
Lula foi um gigante da autodefesa, do ataque e do contra-ataque, e contou com a grande ajuda dos números da economia.
Dilma não tem essa mesma capacidade e talvez não conte com um quadro econômico tão favorável.
Quanto aos ministros, vários deles não terão o que defender; terão, talvez, muito a esconder.
Outros, plausivelmente, defenderão políticas acanhadas, medianas ou insuficientes e, por isso, não convencerão.
Outros, como já vêm fazendo, mudarão de palavra e posição ao sabor dos acontecimentos e das eventuais mudanças ditadas pela presidente.
Somente Palocci, apesar do escândalo do caseiro, e Tombini entram no governo com alta credibilidade.
Se esse quadro que agora imagino se confirmar, haja Carta Capital, Paulo Henrique Amorim e militância para defender o governo Dilma.
A favor dela, por outro lado, conta o fato de que muita gente, seguindo a lógica do "pelo menos", acha que essa marcação de passo não é tão ruim assim; conta também o mais que justificado desprestígio da oposição.
E, pra você, o que falta dizer?

Magna tradição

Os Estados Unidos estão travando um debate estúpido sobre a presença de gays nas Forças Armadas.
Tem gente que acha que é ruim para as Forças Armadas abrigar gays em suas fileiras.
Sei lá o que essas pessoas pensam.
Vai ver que acham que, no meio da batalha, por exemplo, no Afeganistão, o soldado gay americano vai se apaixonar por um guerrilheiro talibã e mudar de lado ou se recusar a combater.
Ou que os gays vão ficar assediando os heterossexuais, no banheiro, no refeitório, nos alojamentos.
Ou que, em vez de se concentrar em estratégia militar, um general gay vai preferir discutir o modelito que os soldados devem usar na próxima campanha.
Ou que as paradas militares correriam o risco de se transformar em paradas gays.
Não sei.
Só sei que a ideia da incompatibilidade entre, ao mesmo tempo, ser gay e ser militar é estúpida e a-histórica.
E me pergunto se a situação não impõe uma recuperação seletiva de uma prática, muito condenada, da educação tradicional.
Você sabe: antigamente os alunos eram obrigados, como corretivo, a escrever na lousa inúmeras vezes uma certa frase, que variava conforme a falta cometida.
A frase poderia ser: "É muito feio e errado dar a língua para a professora".
Os tempos são outros, claro.
E talvez fosse o caso, não de obrigar, mas de sugerir que essas pessoas escrevessem, não na lousa, mas em seus i-pads, i-pods e notebooks, umas cem vezes (podendo usar ctrl C e ctrl V), a seguinte frase:
1) O gay Alexandre Magno foi o maior general de todos os tempos.
2) O gay Alexandre Magno foi o maior general de todos os tempos.
3) O gay Alexandre Magno...
E, pra você, o que falta dizer?

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Os apelos do pelo menos

O Brasil já foi chamado de país do "tudo bem".
A coisa tava ruim, mas a gente se conformava e até fingia que não tava tão ruim assim.
Algumas vezes a gente reagia, de modo tosco, e, por isso, o Brasil foi chamado de país do "jeitinho".
A coisa tava ruim, mas a gente dava uma acochambrada e parecia que tava melhor.
Recentemente, a coisa andou dando uma melhorada, principalmente para os mais pobres.
Tá certo que boa parte dos méritos por essa melhora não é dos próprios brasileiros e se explica pela carona que o país pegou na nova locomotiva do mundo, no caso, a China.
O Brasil poderia ser a China, poderia ser uma das locomotivas do mundo.
Mas, para isso, teria que ter decidido, há algumas décadas, ser uma das locomotivas do mundo.
O Brasil não decidiu, há algumas décadas, ser uma das locomotivas do mundo.
O Brasil também não está decidindo, agora, ser uma das locomotivas do mundo daqui a algumas décadas.
Diante disso, como reage a maioria da elite brasileira, como reage a maioria das pessoas mais esclarecidas, como reage o governo?
Eu acho que os brasileiros deveriam estar chateados pelo fato de o Brasil, do ponto de vista do desempenho socioeconômico e educacional, não ser a China ou algum país dinâmico da Ásia do Leste.
E acho que deveríamos transformar essa chateação em energia e determinação para que, do ponto de vista socioeconômico e educacional, venhamos a ser, em algumas décadas, como a China ou algum país dinâmico da Ásia do Leste.
E acho que podemos ser até melhores do que alguns deles, porque podemos optar por um modelo de sustentabilidade ambiental.
No entanto, a reação da maioria da elite brasileira, a reação da maioria das pessoas mais esclarecidas, a reação do governo é de contentamento.
E, quando alguém mete o dedo na ferida dos problemas do país, quando alguém faz o alerta de que, se o país não tomar certas medidas e adotar certas posturas, daqui a algumas décadas ou mesmo antes, em vez de nos tornarmos uma nova locomotiva do mundo, podemos, sim, ser atirados para fora do vagão de carga, essas mesmas pessoas reagem assim, como um velho vinil arranhado:
- É, mas pelo menos, né? Mas pelo menos, né? Mas pelo menos, né?
Assim, o Brasil se tornou o país do "pelo menos".
Um país do "pelo menos" é um país que opta pelo menos.
E, pra você, o que falta dizer?

Não fui eu que disse

Reproduzo abaixo artigo de Naercio Menezes Filho, do Valor de hoje.

A educação no Brasil e na China

Foram divulgados na semana passada os resultados do Pisa 2009, o Programme for International Student Assessment, da responsabilidade da OCDE, com o desempenho dos alunos de vários países nos exames de proficiência em leitura, matemática e ciências. Esses resultados são muito aguardados pelos países participantes pois revelam como está o aprendizado dos alunos com 15 anos de idade, fazem um ranking de países e mostram sua evolução ao longo do tempo. O que mostram esses resultados?

A grande surpresa deste ano foi o desempenho dos estudantes da província chinesa de Xangai, que participaram pela primeira vez do exame e obtiveram um desempenho espetacular. Os estudantes chineses ficaram em primeiro lugar em leitura, matemática e ciências, superando todos os países da OCDE e os demais países participantes. Em matemática, os chineses obtiveram 600 pontos, quase 38 pontos acima do segundo colocado (Cingapura), 113 pontos acima do Estados Unidos e 214 pontos acima da média dos alunos brasileiros. Se compararmos os alunos de Xangai com os do Distrito Federal (a unidade brasileira com melhor desempenho), a diferença é de 175 pontos. Alguém ainda tem dúvidas de que os chineses irão dominar o mundo?

O desempenho dos alunos brasileiros continua muito ruim, mas vem crescendo ao longo dos anos. Entre os 65 países que participaram do exame, o Brasil ficou em 57º lugar em matemática. Para termos uma ideia de quão crítica é a nossa situação, 70% dos alunos brasileiros estão no nível mais baixo de desempenho em matemática, em comparação com apenas 4,8% dos alunos de Xangai e 8,1% dos coreanos. Em relação aos nossos vizinhos sul-americanos, os alunos brasileiros obtiveram um desempenho em leitura parecido com os colombianos, acima dos argentinos e peruanos, mas abaixo dos chilenos e uruguaios. E pensar que os argentinos estavam entre os povos mais educados da América Latina no início do século passado.

Assim, a desigualdade na qualidade da educação está aumentando. Vale notar também que grande parte do avanço obtido em leitura ocorreu entre as meninas, sendo que o crescimento da nota entre os meninos foi insignificante.Entre 2000 e 2009 o desempenho dos alunos brasileiros aumentou 16 pontos em leitura, 52 pontos em matemática e 30 pontos em ciências. Assim, o maior avanço foi em matemática, disciplina em que os alunos brasileiros tinham o pior desempenho. Mas, é preciso aumentar o ritmo desse avanço, caso contrário levaremos 40 anos para alcançar o desempenho atual dos chineses. Outro ponto importante é que o nosso aumento da proficiência em leitura ocorreu às custas de uma maior desigualdade. Enquanto o desempenho dos nossos melhores alunos aumentou cerca de 30 pontos, entre os piores praticamente não houve melhora.

Vale a pena contrapor a nossa evolução educacional com a ocorrida no Chile. Em leitura, por exemplo, o desempenho dos alunos chilenos aumentou 40 pontos, mais do que o dobro dos brasileiros. Entretanto, no caso do Chile o desempenho aumentou mais entre os piores alunos do que entre os melhores. Assim, a qualidade da educação no Chile melhorou com queda na desigualdade, o melhor dos mundos. Por fim, a melhora ocorreu tanto entre os meninos como entre as meninas. Mas, que políticas educacionais tiveram efeito tão positivo no Chile?

Segundo o relatório do próprio Pisa, as principais políticas parecem ter sido o foco nas escolas com pior desempenho, o aumento do número de horas-aula, mudanças no currículo nacional, aumento dos gastos com educação e avaliação completa do desempenho dos professores das escolas públicas, incluindo observação do seu desempenho em classe. Os professores que forem reprovados três vezes nessa avaliação são demitidos. Além disso, as escolas e os professores com melhor desempenho recebem mais recursos e maiores salários. Aumento de gastos com mais horas-aula, acompanhado de medidas que introduzam a meritocracia na vida escolar parece ser a receita para o sucesso.

Em suma, o desempenho dos alunos brasileiros vem melhorando na última década, graças a uma série de políticas educacionais corretas que foram sendo introduzidas por diferentes ministros, no sentido de descentralizar a gestão, criar sistemas de avaliação, divulgar os resultados das avaliações por escola e estabelecer metas para cada uma delas. Além disso, inovações nas redes estaduais e municipais de educação, principalmente aquelas com ênfase na meritocracia, tiveram um papel importante.

Entretanto, esse avanço tem ocorrido de forma lenta e puxado pelo desempenho dos melhores alunos e das meninas. Assim, enquanto a desigualdade no acesso à educação está declinando e puxando para baixo a desigualdade de renda, a desigualdade na qualidade da educação caminha no sentido contrário, o que retardará a queda na desigualdade de oportunidades.

Por fim, os resultados do Pisa mostram claramente que os chineses estão fazendo a sua lição de casa, obtendo avanços significativos nas questões mais fundamentais da sua sociedade, para torná-la mais competitiva. Enquanto isso, os brasileiros passaram o ano inteiro discutindo a taxa de câmbio!

Naercio Menezes Filho é professor Titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper e professor associado da FEA-USP

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Produtividade e eficiência

Muita gente ainda se ilude com a tese de que a riqueza dos países do chamado primeiro mundo advém meramente da exploração dos recursos naturais e do trabalho do mundo pobre ou emergente.
Obviamente, esse é um lado da verdade, mas está muito longe de ser toda a verdade.
Toda a verdade deve incluir um elemento fundamental: a produtividade e a eficiência do trabalho nos países do primeiro mundo, que é, em geral, muito maior do que nos outros países.
O que é produtividade?
Grosso modo, é a capacidade de fazer mais e melhor em menos tempo.
É a grande parceira da eficiência, que é, grosso modo, a capacidade de fazer mais e melhor ao menor custo possível.
No mundo privado, produtividade e eficiência, quando se encontram com a demanda, garantem a expansão ótima do capital.
No mundo público, o da administração pública, produtividade e eficiência, quando se encontram com os interesses de curto e longo prazo da sociedade, garantem prosperidade e melhora da qualidade de vida da população.
Como trilhar o caminho da produtividade e da eficiência?
Investindo em pesquisa e formação, tanto escolar quanto extraescolar.
Pesquisa e formação são a base da inovação, e a inovação é a chave para o aumento da produtividade e da eficiência.
Isso leva tempo.
O Brasil já investe em pesquisa e formação.
Mas investe menos do que deveria.
Seria melhor dizer: nossos esforços em pesquisa e formação ainda não têm a intensidade, a produtividade e a eficiência necessárias.
Isso significa que, se quisermos nos tornar, no futuro, mais produtivos e eficientes, teremos que começar a ser, desde já, mais produtivos e eficientes.
E, pra você, o que falta dizer?

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Não fui eu que disse

Segue artigo sobre educação, de João Batista Araujo e Oliveira, publicado no Valor de hoje.


A educação está no rumo certo?


A presidente eleita Dilma Rousseff declarou que a Educação no Brasil está devidamente equacionada. Cabe examinar, portanto, se o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) é portador de uma agenda de futuro, levando à conquista de novos patamares. Parece que não.

Em que consiste o PDE? Em um conjunto de propostas com recursos e metas de atendimento. Engloba projetos diferenciados, que vão da construção de creches ao apoio aos alunos do ensino superior, passando por merenda, transportes, materiais didáticos, informática, escolas técnicas, cursos a distância, provinha Brasil de alfabetização, formação de professores, assistência social, assistência à saúde e educação no campo. Individualmente, os projetos podem vir a ter maior ou menor eficácia. Sua simples existência, sem dúvida, guarda méritos, pois organiza a ação do Ministério da Educação, reduz o balcão de ações pontuais e estimula um mínimo grau de planejamento pelos Estados e municípios. Mas nada garante que essas ações surtirão efeitos sistemáticos e duradouros nos fundamentos que asseguram educação com equidade e qualidade.

Cabe registrar um aspecto extremamente positivo no PDE: as metas para melhoria de qualidade, que são avaliadas por meio da Prova Brasil. Concordemos ou não com as metas, elas mexeram com o país e trouxeram transparência ao setor: agora é preciso mostrar resultados. Hoje, há pelo menos algumas dezenas - talvez centenas - de prefeitos que começam a se preocupar com as notas dos alunos nessa prova. Só isso já justificaria a passagem do ministro Fernando Haddad pelo MEC.

A observação do que vem ocorrendo desde a implementação da Prova Brasil, e especialmente as explicações que são dadas para eventuais avanços nessa prova, demonstram que ainda não aprendemos a estabelecer uma relação correta entre meios e fins. Não aprendemos a identificar as variáveis críticas que podem contribuir para colocar o país numa trajetória de qualidade. As próprias ações do Plano de Desenvolvimento a Educação reforçam a crença de que fazer alguma coisa, ou muita coisa, é melhor do que não fazer nada.

Talvez no estágio atual, em que os indicadores ainda são muito baixos, isso funcione. É o conhecido efeito Hawthorne ou efeito novidade. Um pouco de atenção e a instauração de melhorias e moralidade na gestão, com certeza, explicam alguns avanços. Mas não nos levará ao pódio.

As reformas educacionais empreendidas em outros países e a estrutura que rege o funcionamento dos sistemas de ensino com elevado desempenho educacional mostram que, para melhorar, são necessárias outras condicionantes. Algumas dessas, alvo de políticas públicas: programas de ensino claros e exequíveis, professores bem formados, meios administrativos e financeiros para a escola funcionar e avaliação externa de preferência associada a algum tipo de transparência ou incentivo. A pressão social também é outra condicionante. A cobrança social sobre a Educação é função da sociedade, e inexiste no caso da escola pública no Brasil.

Na escola, as condições dependem, fundamentalmente, do exercício da liderança pelo diretor e das consequências de sua atuação. Nos países que alcançaram ou superaram a média do PISA, que é o termômetro internacional de qualidade da educação, a educação funciona assim. E naqueles que integram esse ranking, as reformas educativas foram feitas de maneira progressiva, ao longo de décadas, começando de baixo para cima. Nenhum tentou fazer tudo ao mesmo tempo. O primeiro requisito da reforma é suprir as escolas com professores bem formados. O segundo é assegurar ao diretor da mesma os meios, a autoridade e o poder para exercer o seu trabalho - os graus de autonomia variam nos diferentes países.

A eficácia de uma reforma se mede não apenas pela média no PISA, mas pela distribuição das notas das escolas. Essa é a medida da equidade: nos países desenvolvidos, a média das escolas é bastante semelhante: isso reflete a existência de um padrão de ensino. No Brasil, a gigantesca dispersão dos resultados entre escolas públicas aponta a falência das ações empreendidas pelas redes de ensino. Ademais, em vez de pacto, temos uma bagunça federativa, em que cada nível atua diretamente na escola, mas não se compenetra das ações que lhe são próprias.

O desafio de uma reforma educativa no Brasil requer uma ação em dois tempos. De um lado, e no curto e médio prazos, são necessárias medidas para atenuar as fortes limitações gerenciais das escolas e redes de ensino, bem como as limitações ainda mais fortes decorrentes da precária formação de professores. Há medidas bem conhecidas para isso, nada a ver com o PDE. De outro, para o longo prazo, uma reforma só começará a mudar o vetor da qualidade quando o país for capaz de implementar uma política de atração e manutenção de jovens altamente qualificados no magistério.

Vale registrar que todas essas iniciativas deverão ser implementadas em contexto corroído pelas pressões corporativistas e de cunho ideológico, além de totalmente alheio às evidências científicas sobre o que efetivamente funciona em Educação. Até lá, teremos apenas remendos. Pensando bem, mesmo como remendo necessitamos de algo muito mais focado e robusto do que o que hoje existe no PDE.

João Batista Araujo e Oliveira presidente do Instituto Alfa e Beto

domingo, 12 de dezembro de 2010

A rotina do tina

"Não há alternativa".
Esse foi o lema utilizado pelos chamados neoliberais para defender a redução do Estado, nos anos 80 e 90 do século passado, sobretudo na Inglaterra e nos Estados Unidos.
Em inglês, a frase ficou conhecida por sua iniciais: tina ("there is no alternative").
Ironicamente, tina é, por assim dizer, o lema do PT desde as eleições presidenciais de 2002.
Não votar no PT seria necessariamente recair nas mazelas do tucanato e suas políticas "neoliberais".
O "não há alternativa", de remédio-veneno do neoliberalismo, converteu-se, no Brasil, em seu antídoto.
Não há frase alternativa na boca dos petistas.
É pintar uma sucessão presidencial e lá vêm eles com o bordão: "não há alternativa", tem que votar no PT.
No momento, o Brasil vive uma situação curiosa: Dilma ainda não tomou posse, mas já se fala muito em quem a sucederá em 2014.
Há quem aposte numa volta de Lula - e ele só não volta, imbatível, diga-se de passagem, se não quiser.
Mas há quem já esteja se pré-lançando, confiando na aposentadoria de Lula.
É o caso de Eduardo Campos e Aécio Neves.
Um e outro de olho na herança do lulismo.
Um e outro dizendo que o PT não é mais alternativa.
Um e outro falando em renovação da agenda, via eficiência do Estado e efetividade das políticas públicas.
O PT já começou a se movimentar e ensaia retomar seu bordão: tina neles!
Quer abater a pomba e o tucano antes mesmo que comecem a voar.
Mas a acusação principal do PT contra um e outro é que se trata de dois personalistas.
Ora, esse argumento não vale se saído da boca de um petista: o personalista-mor da política brasileira é o petista Lula, e o PT, de partido, converteu-se em mero agrupamento adesista e acrítica máquina eleitoral.
Eduardo Campos e Aécio Neves são, sem dúvida, dois políticos de viés personalista e autoritário, embora num e noutro quesito, repito, nenhum dos dois chegue aos pés, pelo menos não ainda, do "rei" Lula.
Pode ser, apesar de seus defeitos, que consigam, já no mandato de Dilma, trazer alguma boa novidade para a agenda nacional.
E pode ser que, em 2014, em função inclusive da boa performance de um e outro à frente do governo de Pernambuco e Minas, se apresentem como candidatos presidenciais a se considerar, malgrado seus vícios personalistas e autoritários.
Pode ser...
Pode ser também que a maldição do tina em 2014 recaia sobre o próprio PT.
Por último, só uma perguntinha: Marina, cadê você?
Aparecer para falar somente de código florestal é muito pouco para quem teve uma participação tão destacada na eleição presidencial...
E, pra você, o que falta dizer?

sábado, 11 de dezembro de 2010

Repisando o Pisa

No Pisa de 2006, participaram 57 países e nossa posição geral foi 52a.
No Pisa de 2009, participaram 65 países e nossa posição geral foi 53a.
Esse é um dado frio, duro, que obviamente não deve servir para desmerecer os avanços conquistados, mas deve, sim, servir para frear quaisquer tendências ao excesso de otimismo.
Outro dado merece destaque: o desempenho dos chamados países asiáticos dinâmicos.
No post anterior, informei como os mais importantes entre esses países se posicionaram em cada disciplina.
Isso pode significar o seguinte: do mesmo modo que o dinamismo econômico do mundo tem se deslocado da América do Norte e da Europa para o leste da Ásia, pode estar havendo um deslocamento do dinamismo educacional do mundo no mesmo sentido.
Mais uma vez, portanto, vale a máxima de que temos muito a apreender com os países asiáticos dinâmicos.
Por último, embora haja tanto ainda a discutir sobre esse tema: o ministro Haddad disse que, na média, os países mais ricos estão estagnados no Pisa, numa tentativa de enfatizar os avanços brasileiros; mas, ministro, há muitos países que não estão estagnados, e são esses que nos interessam, são os que estão crescendo e melhorando que importam para nós, são eles a nossa referência.
E, pra você, o que falta dizer?

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Outra pisa no Pisa?

Foram amplamente divulgados os resultados do Pisa-2009, o programa internacional de avaliação de estudantes de 15 anos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A posição do Brasil, em relação aos exames passados, oscilou de rabeira da rabeira para rabeira.
Nossa evolução não pode ser comemorada, mas também não pode ser desprezada.
É positivo que o Brasil tenha tido, entre todos os países analisados, o 10o. maior incremento da nota de Leitura, o 2o. maior incremento da nota de Matemática e o 5o. maior incremento da nota de Ciências.
Esses resultados só não entusiasmam, porque partimos de uma base muito acanhada e ainda nos encontramos muito mal posicionados.
No exame de 2009, que contou com 65 países, entre convidados e membros da OCDE, o Brasil ficou em 53o. lugar na classificação geral, o que é ainda vexatório.
Na classificação por disciplina, o Brasil ficou em 53o. em Leitura e em Ciências e em 57o. em Matemática.
Apesar de tudo, estamos indo no caminho certo?
Parece que sim.
E isso deve servir para nos animar e para examinarmos com todo o cuidado o que falta dizer e fazer.
Estamos, porém, indo devagar e a redução da distância em relação aos países mais bem posicionados é, por isso, excessivamente lenta. Além disso, é preciso considerar que, nesse ritmo, demoraremos demais até podermos dizer que contamos com bom desempenho de nossos alunos no que se refere às nossas próprias necessidades sociais, culturais e econômicas.
Há, certamente, muito mais para dizer sobre o desempenho do Brasil no Pisa e as perspectivas da nossa educação.
Por ora, peço que você dê uma olhada na posição dos asiáticos nas diferentes disciplinas, considerando que os resultados da China se referem somente a Xangai:

Leitura - China, 1o., Coreia do Sul, 2o., Hong Kong, 4o., Cingapura, 5o., Japão, 8o.


Matemática - China, 1o., Cingapura, 2o., Hong Kong, 3o., Coreia do Sul, 4o., Taiwan, 5o., Japão, 9o.


Ciências - China, 1o., Hong Kong, 3o., Cingapura, 4o., Japão, 5o., Coreia do Sul, 6o.

E, pra você, o que falta dizer?

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

What's this, a quiz?

Quem escreveu os trechos abaixo sobre o Brasil?
Quando?
Em que obra?

"Um país cuja importância para as próximas gerações é inimaginável até fazendo as combinações mais ousadas."

"Impossível ter uma visão completa de um país que ainda nem consegue se perceber como conjunto, além de se estar em meio a um processo tão intempestivo de crescimento que qualquer relatório e qualquer estatística já estarão ultrapassados antes que a informação se torne escrita e que esta escrita, por sua vez, vire palavra impressa."

Só falta você dizer.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Coletivo que não cola

A Revolução Cultural chinesa, que queimou livros e massacrou intelectuais, foi coletiva.
O nazismo foi coletivo.
Uma só escova de dentes para muitos é coletiva.
Banheiro no corredor do prédio é coletivo.
Ônibus superlotado é coletivo.
Gente irresponsável, quando quer se eximir de seus erros, diz que a decisão foi coletiva.
A burra unanimidade é coletiva.
As patrulhas ideológicas e as seitas e todos os tipos de fundamentalismo falam em nome do coletivo.
Aulas inúteis de Português obrigam os estudantes a decorar os coletivos.
Tem coletivo que não cola.
Tem coletivo contra o qual um indivíduo não deve calar.
E, pra você, o que falta dizer?

Uma CPI mais produtiva

Há uma máxima entre analistas do Congresso Nacional segundo a qual as comissões parlamentares de inquérito são, tipicamente, um instrumento da oposição.
Uma máxima pode servir para muitas coisas, inclusive para prestar desserviços.
Essa máxima presta uma grande desserviço à compreensão do que é ou pode ser uma CPI.
A CPI como "instrumento da oposição" tornou-se um concepção, se não obsoleta, bastante desgastada.
Por quê?
Porque, ao longo dos anos, as diferentes oposições utilizaram CPIs para tentar convencer a opinião pública de que os diferentes governos eram corruptos ou tremendamente omissos e ineficientes.
Ora, o tempo mostrou, sobretudo a partir do chamado mensalão, que as acusações de corrupção, sejam sérias ou não, formais ou não, pesam, em maior ou menor medida, sobre todas ou quase todas as forças políticas do país.
Que sentido tem, então, montar uma CPI para a oposição dar pedrada no governo se vai levar pedrada de volta?
Qual o sentido de um processo que, ao final, vai deixar como saldo, para muitos, a sensação amarga de que tudo, governo e oposição, é farinha do mesmo saco.
Por ora, pelo menos, me parece muito mais correto deixar as denúncias de corrupção a cargo de Ministério Público, Polícia Federal, TCU, CGU etc.
Para que, então, serve ou pode servir uma CPI?
Para fazer o Congresso Nacional trabalhar mais e melhor pelo Brasil.
Nos anos Lula, fizemos, na economia, mais do mesmo e chamamos mais gente para participar dos ganhos.
É isso que explica a aceleração do crescimento e a redução da desigualdade.
Alguns acham que o que Lula fez foi enganação; outros acreditam que foi a obra de um grande estadista.
Os vereditos sobre os dois mandatos de Lula, daqui por diante, importam menos para o país do que o investimento na compreensão das tarefas que temos pela frente.
É consenso que o Brasil precisa aumentar a produtividade de sua economia.
Então, por que o Congresso Nacional não faz uma CPI da produtividade?
Alguns poderão dizer: a CPI existe para investigar um fato determinado, e não há aí nada para se investigar, uma vez que todos sabem que, para aumentar a produtividade, é preciso melhorar a educação e a infraestrutura, instituir a meritocracia no serviço público etc.
Mas isso tudo é muito vago.
Precisamos de um entendimento mais claro e objetivo e precisamos também aperfeiçoar, ampliar, intensificar e concatenar medidas que já estão sendo tomadas nesse sentido.
Precisamos de um debate público, organizado, plural.
Precisamos de uma verdadeira agenda da produtividade, que se desdobre em planejamento e mobilização do Estado e da sociedade.
Precisamos comprometer o Legislativo, o Executivo, o Judiciário e os cidadãos com essa agenda.
A agenda da produtividade não é de nenhum governo ou segmento social, é do país.
Não vejo nenhuma temática que tenha prioridade em relação a ela.
Uma CPI da produtividade, com vistas a contribuir para que o Brasil se torne um país muito melhor para todos - eis algo, me parece, bem mais útil e efetivo do que uma CPI como "instrumento da oposição".
O que você acha da ideia?
O que você acha que falta dizer?

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Não à opinião

Se, no Brasil, uma pessoa quiser expressar suas opiniões políticas, o que ela poderá fazer?
1) Criar um blog.
2) Conversar com os amigos.
3) Conversar com os colegas de trabalho.
4) Mandar e-mails para jornais, revistas, blogs, lideranças políticas.
5) Conversar com a família ou com a pessoa amada, antes ou depois do amor.
6) Fazer um protesto solitário.
Poderá participar das reuniões do sindicato?
Não, porque os sindicatos não fazem mais reuniões e, nas raras assembleias, são sempre os mesmos que falam.
Poderá participar das reuniões do partido?
Não, porque o partido também quase não faz reuniões e, nas convenções ou congressos, quem decide são sempre os mesmos.
Poderá participar de movimentos sociais?
Não, porque os movimentos sociais são na verdade microcúpulas fechadas, com teses e posições cristalizadas.
Poderá fundar uma ONG?
Sim, mas ela provavelmente não irá para a frente e será abandonada em menos de um ano.
Quem quiser participar da vida política no Brasil, terá que aderir ao projeto de alguma liderança local, regional ou nacional.
No plano nacional, poderá aderir a Lula-Dilma (enquanto os dois forem um só), a Aécio, Marina, Eduardo Campos etc.
Mas na porta de cada evento de adesão haverá sempre uma mensagem: pode entrar, mas não me venha com opiniões.
E, pra você, o que falta dizer?

Passo à frente (e pé atrás?)

Mais renda, mais consumo.
Mais consumo, mais dignidade, sobretudo para quem estava em situação de subconsumo.
Mais dignidade, mais consciência dos próprios direitos e mais poder para lutar por eles.
Mais consciência dos direitos, mais deveres.
Nos últimos anos, o Brasil aumentou e distribuiu melhor o bolo da riqueza nacional.
O aumento ocorrreu graças à relativa estabilidade macroeconômica, conqustada no governo FHC, à abundância de recursos naturais, nem sempre utilizados de maneira sustentável e à competitividade externa, tanto tecnológica quanto gerencial, de alguns setores de nossa economia.
A distribuição melhorou graças às políticas do governo Lula, que se apoiou na parte bendita da herança de FHC e aproveitou os êxitos do nosso setor externo para turbinar o mercado interno, via aumento da capacidade de consumo da população brasileira, em especial dos menos favorecidos.
E agora?
Um dos desdobramentos pode ser: a classe C, e também a D e a E, passam a compreender que somente aumento de renda não basta e que merecem equipamentos públicos na quantidade e qualidade necessárias.
Passam a compreender que merecem, por exemplo, escola pública de qualidade.
Passam, em seguida, a compreender que, sem sua mobilização intensa e esclarecida, a escola de qualidade não virá.
Essa nova compreensão gera, portanto, o dever da participação.
As classes C, D e E passam a cobrar de governantes, gestores e professores mais compromisso e melhor desempenho na área educacional.
Eleição após eleição, os candidatos mais compromissados e mais bem qualificados para empreender ações que melhorem a educação são cada vez mais bem votados.
Os filhos das classes C, D e E passam a frequentar melhores escolas.
Mais bem qualificados, os filhos das classes C, D e E cada vez mais se habilitam a integrar os setores da mão de obra que contribuem para a competitividade tecnológica e gerencial e, consequentemente, para o aumento da riqueza nacional.
Habilitam-se ao mesmo tempo a colher uma parcela maior da riqueza que ajudaram a aumentar.
O circuito se fecha, abrindo-se, ao mesmo tempo, para nova era de expansão e distribuição da riqueza.
É nesse sentido que estamos caminhando?
E, pra você, o que falta dizer?

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O encanto, por enquanto

Alguns dizem: Lula não volta em 2014.
Por quê?
Porque não quer quebrar o encanto: num novo governo, seu prestígio certamente seria menor, e para Lula o grande negócio é entrar para a história como um presidente com mais de 80% de aprovação.
O problema, porém, é que Dilma já começa a montagem de sua equipe com medo de quebrar o encanto.
Como foi escolhida unipessoalmente por Lula, como fez uma campanha comprometida com a continuidade, como quer desfrutar de popularidade pelo menos não muito menor do que a de Lula, Dilma está pisando em ovos.
No que ser refere à montagem da equipe, por exemplo, um analista já destacou que até aqui os indicados para os ministérios são ou lulistas ou moderados, o que significa que, de duas formas distintas, ela está apostando na prudência.
Não deixa de ser bom para o Brasil, diante do temor de alguns de que Dilma venha a fazer um governo tresloucadamente populista e autoritário.
Esse temor, por ora, parece bem distante da realidade.
Por outro lado, um governo hesitante e excessivamente cauteloso não deixa de ser ruim para o Brasil, diante de necessárias e urgentes mudanças de rumo que apontem para o aumento da taxa de investimento e da competitividade internacional de nossa economia.
Os comentaristas de futebol de antigamente gostavam de iniciar a análise da partida dizendo que "até aqui os dois times estão se estudando".
A bem da verdade, o que ocorria, ao menos muitas vezes, é que os dois times estavam mesmo era bem desarrumados e não sabiam direito o que fazer em campo.
Apesar de Dilma ainda não ter tomado posse como presidente, o jogo já começou para ela.
E, cedo ou tarde, ela vai ter que mostrar capacidade própria para encantar os brasileiros, com base em ações que tenham a sua marca e, por isso, divirjam em maior ou menor medida das ações de Lula.
A máxima de que "não se mexe em time que está ganhando" simplesmente não se aplica ao Brasil de hoje.
E, pra você, o que falta dizer?

domingo, 5 de dezembro de 2010

Silêncio insustentável

Analistas dão conta de que o PSDB, assim como ocorreu anteriormente a sua desastrada campanha presidencial, permanece, nacionalmente, pouco ativo, dividido e desorientado.
Sinceramente, a crise nacional do PSDB não me dói.
O PSDB, assim como o PT e tantos outros, pertence a uma geração de partidos já finados.
O que me preocupa é o silêncio de Marina Silva.
Uma candidata que chamou para si a bandeira da sustentabilidade ambiental e da qualidade da saúde e da educação deveria estar, no mínimo, glosando os principais lances da política nacional.
Se quiser dar o melhor tratamento ao capital político que acumulou, Marina não poderá se manter em silêncio.
Mais: terá que aprofundar sua mensagem em favor de uma lógica de desenvolvimento distinta da adotada pelo governo Dilma.
Segundo um adágio tão antigo quanto citado, "não existe vácuo na política".
Assim, Marina, ao dormir de touca, permitiu que parte do espaço que é potencialmente seu fosse ocupado recentemente - e muito bem ocupado - por Eduardo Campos, presidente nacional do PSB e governador reeleito de Pernambuco.
A participação mais vigorosa de Eduardo Campos no debate nacional enriquece nossa vida política.
Já o retraimento de Marina tem o efeito contrário e reforça o ponto de vista de uma parcela de seus críticos, para quem sua candidatura era inoportuna e inconsistente.
E, pra você, o que falta dizer?

Não fui eu que disse

Segue excelente artigo de Jair Ribeiro, publicado na Folha de hoje.


Revolução na educação pública


Sinceramente, não entendo por que mais pessoas não se sentem revoltadas diante das condições da educação pública neste país.
Somos uma nação em que cerca de 50% das crianças brasileiras da 5ª série são semianalfabetas. Dos 3,5 milhões de alunos que ingressam no ensino médio (antigo colegial), apenas 1,8 milhão se formam.
Como consequência, todos os anos nós jogamos milhões e milhões de adolescentes despreparados no mercado de trabalho, sem qualquer perspectiva de ascensão social e econômica.
Isso não lhe causa indignação?
Essas estatísticas refletem décadas -ou melhor, centenas de anos- de descaso com a educação.
Nós, brasileiros, políticos e sociedade civil, simplesmente não priorizamos a educação.
Com isso, impedimos que o país melhore a sua desigualdade social, reduza a violência ou mesmo consiga sustentar uma taxa de crescimento mais estável.
As estatísticas recentes demonstram que o sistema não apresentou uma melhora significativa nos últimos anos. Nesse ritmo, jamais atingiremos o nível de educação dos países desenvolvidos em 2022, como propõe o governo.
Mesmo porque trata-se de uma meta móvel: até lá, os demais países terão avançado substancialmente mais. Precisamos de uma verdadeira revolução na educação pública brasileira.
Os Estados Unidos a fizeram em 1870, ou seja, há 140 anos! Em uma década, dobraram o investimento na educação pública e universalizaram o ensino. Em 1910, todas as crianças tinham acesso a uma escola de período semi-integral.
Outro exemplo conhecido é o da Coreia. Na década de 70, iniciaram uma verdadeira revolução na qualidade da educação pública. Com isso, saíram de um PIB per capita abaixo do brasileiro para um dos mais altos do mundo em menos de duas gerações.
O modelo mais recente é o chinês. Muito se fala nos investimentos em infraestrutura, mas pouco se divulga o enorme esforço educacional chinês, do ensino primário aos cursos de doutorado.
Mas o que podemos fazer? Primeiro, conscientizar a população em geral para o verdadeiro desastre que é nossa educação pública. Apenas com o apoio da população poderemos cobrar da classe política as medidas revolucionárias (já amplamente conhecidas dos experts em educação) imprescindíveis para atacar de frente o problema.
Em segundo lugar, envolva-se pessoalmente. Educação pública é uma questão por demais relevante para se deixar apenas na mão do Estado. Há inúmeras ONGs de excelência que contribuem para a melhoria do quadro educacional brasileiro (por exemplo, o Instituto Ayrton Senna, a Fundação Bradesco ou mesmo a nossa Parceiros da Educação, para nomear algumas).
Participe delas, como voluntário ou mantenedor. Quanto mais envolvido com a realidade da educação pública, mais consciente você estará dos nossos desafios.
Precisamos de mais aliados nessa revolução!


JAIR RIBEIRO, empresário, é co-coordenador da Associação Parceiros da Educação, ONG que promove a parceria entre escolas públicas e empresários.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Vedete tipo Chevette?

Confesso: eu tive um Chevette.
O meu Chevettinho, 1.6, a álcool.
Meu Chevettinho era o ouro na descida da ladeira.
No tempo em que eu achava lindo correr demais, contava vantagem:
- Botei 140 km/h no meu Chevettinho.
Só não dizia que era na descida da ladeira.
Eu queria acreditar que a façanha era do meu Chevettinho.
E era.
Mas era mais da descida da ladeira.
Porque, na subida, meu Chevettinho virava um Chevettão, pesadão, meio carreta, meio caminhão.
Eu gostava do meu Chevettinho.
Meu Chevettinho era muito, mas muito melhor que nada.
Mas era só um Chevettinho.
E minha tentativa de autoengano (porque no fundo eu sabia que não enganava mais ninguém) era só mesmo uma tentativa de autoengano.
Não me queiram mal se eu falo de carro mesmo sem entender nada de carro.
Também não me queiram mal se eu comparo o meu Chevettinho com o momento atual da economia brasileira, mesmo sem entender nada de economia.
Nossa economia é o ouro na descida da ladeira; é, por conta disso, uma das vedetes do mundo atual.
Mas, cedo ou tarde, chega a hora de subir.
E, para você, o que falta dizer?

Tanta pergunta é falta de educação?

O Brasil adota um regime de metas da inflação.
Não deveria também adotar um regime de metas da educação?
Em tese, nossa meta é chegar a 2022 com os mesmos indicadores de qualidade que os países mais ricos apresentavam em 2003.
Porém, quem presta contas da execução dessa meta?
Quem controla a execução dessa meta?
Meta sem prestação de contas e sem controle da execução não é meta.
Não deveríamos ter metas de leitura e circulação de livros?
Não deveríamos ter metas de acesso à internet?
E essas metas, de leitura de livros e acesso à internet, não deveriam ser tipificadas e qualificadas, para buscarmos mais a leitura de livros acadêmicos, para-acadêmicos e literários, e mais acessos a sites de “conteúdo”?
Não deveríamos acompanhar a execução dessas metas um pouco como acompanhamos, além do “Brasileirão”, as metas de inflação?
Não deveríamos discutir intensa, qualificada e amplamente se a educação no Brasil contribui para a formação de cientistas, pensadores, cidadãos?
Mais: todos querem saber as credenciais do presidente Banco Central.
Todos querem saber se ele é digno do cargo.
Houve agora, por exemplo, uma discussão intensa sobre as credenciais do Tombini.
Foi assim também com o Meirelles, o Armínio Fraga etc.
Mas não foi assim com o Haddad, como não foi com o Tarso Genro, como não foi com o Cristovam Buarque, como não foi com o Paulo Renato.
Não deveríamos sempre conhecer e discutir as credenciais do ministro da Educação?
Não deveríamos exigir currículo, metas, sabatina no Senado, não só para o presidente do Banco Central, mas também para o ministro da Educação?
Não deveria ser tão tensa e delicada a escolha do ministro da Educação quanto é tensa e delicada a escolha do presidente do Banco Central?
O noticiário político dá conta de que o Haddad deve ser reconduzido, pela Dilma, ao MEC. Essa recondução não deveria ser precedida de um balanço público  e sério de sua gestão à frente da pasta nos últimos anos?
O presidente da República não deveria discutir frequentemente com a população os problemas e desafios da educação?
Não deveria haver uma agenda consensual da educação, que comprometesse fortemente o presidente, o conjunto do ministério, os governadores, os senadores, os governadores, os deputados federais e estaduais, os prefeitos etc.?
E, pra você, o que falta dizer?

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O incrível Rilke

Livro e gente.
Poema e pessoa.
Letra e voz.
Papel e carne.
Tinta e sangue.
Verso e conversa.
Texto e mundo.
Solidão e contato.
Silêncio e paixão.
Poesia, assim como toda a literatura, é só isso.
E é demais.
Aprendi isso comigo.
Mas Rilke me ajudou tanto.
E, pra você, o que falta dizer?

Meia classe média

Nelson Rodrigues disse: o ser humano é de classe média.
Nelson Rodrigues era um gênio, e como gênio estava além e aquém do pensador.
Um gênio alcança a verdade mais rápido do que o pensador; mas o pensador a elabora melhor.
Se, além do insight do gênio, Nelson Rodrigues tivesse a elaboração do pensador, teria dito: o ser humano civilizado é de classe média.
A civilização é a cultura criada pelas cidades, nasceu com elas.
Como cultura, a civilização não é melhor nem pior que as culturas aldeãs ou tribais; ela é apenas a cultura própria do meio urbano.
Se a civilização nasceu junto com as cidades, as cidades nasceram junto com a classe média.
Nunca houve cidade sem classe média, ainda que uma classe média pequena, dependente, embrionária.
Nunca houve também classe média sem cidade, ainda que uma cidade com uma certa cara de aldeia.
Civilização, cidade e classe média são enredo, palco e personagem da mesma história.
Com o passar do tempo, muitas cidades, com sua classe média e sua cultura civilizada, se tornaram democráticas e republicanas.
Criou-se, na longa linha da história, uma identificação profunda entre civilização, democracia e república, a ponto de muitas monarquias, de tão civilizadas e democráticas, terem se tornado também, digamos, republicanas.
A classe média, por seus vínculos profundos com a civilização, a democracia e a república, tende com frequência contra os privilégios.
No Brasil, uma parte da classe média é contra os privilégios na política, daí sua aversão aos políticos corruptos e parasitas. Essa aversão é tão forte que algumas vezes se confunde com aversão à política, o que é um absurdo, uma vez que contraria o espírito civilizado, democrático e republicano da classe média, que depende da participação política para se afirmar.
Em 1964, por exemplo, em parte por aversão à política e aos políticos, um pedaço da classe média brasileira apoiou o golpe militar.
Outra parte de nossa classe média luta contra os privilégios socioeconômicos, responsáveis pela existência de marginalizados e excluídos. Essa luta é tão intensa que algumas vezes abdica do direito à liberdade em nome da igualdade, o que é um absurdo, uma vez que contraria o espírito civilizado, democrático e republicano, que precisa de garantias contra Estados repressivos para se afirmar.
Até hoje, por exemplo, em parte por abominar privilégios socioeconômicos, um pedaço da classe média brasileira admira a ditadura cubana.
Tomara que essas duas pontas do espírito da classe média se aproximem mais na política brasileira.
Tomara que, no futuro, os que não conciliam com o antidemocrático, antirrepublicano e, apesar de seus versos, incivilizado Sarney venham a ser sempre os mesmos que aplaudem a diminuição das desigualdades sociais.
E, pra você, o que falta dizer?

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Shake, sheik, shake!

Foi aprovada agora há pouco na Câmara dos Deputados a chamada emenda Ibsen, que redefine a participação de estados e municípios nos royalties do petróleo.
O critério de divisão agora é o mesmo que rege a distribuição de recursos para o Fundo de Participação dos Estados e o Fundo de Participação dos Municípios.
Há duas questões importantes aí:
1) o critério atual tem problemas, sim, e precisava ser revisto; porém a mudança teria que ser paulatina para não destroçar as contas de estados que recebem grandes somas, como é, sobretudo, o caso do Rio de Janeiro.
2) os recursos dos royalties têm que ser previamente carimbados para ações essenciais ao desenvolvimento socioeconômico do país; não podem ficar soltos na mão de governador ou prefeito, todos com liberdade para gastar do jeito que quiserem.
Estudiosos do petróleo sempre alertam para o fato de que as receitas astronômicas do petróleo geram acirradas disputas distributivas. Unidades da federação, segmentos sociais e lideranças políticas entram numa guerra insana para ver quem fica com mais, cada um querendo parasitar a riqueza do petróleo para subir na vida sem esforço.
Nem bem a exploração do pré-sal começou e já tem candidato a sheik se agitando pra todo lado.
E, pra você, o que falta dizer?

Dilema de Dilma

Até 2007, economistas pró-mercado e pró-Estado concordavam num ponto: para crescer, o Brasil precisa tornar sua economia internacionalmente mais competitiva.
Uns e outros concordavam que, para isso, era preciso aumentar a taxa de investimento da economia.
Discordavam, porém, acerca do caminho para aumentar a competitividade e o investimento.
Os economistas pró-mercado defendiam a redução da carga tributária, o que liberaria o setor privado para investir em aumento e modernização da capacidade produtiva; defendiam também forte redução dos gastos correntes da máquina pública, o que liberaria o Estado para investir em educação e infra-estrutura.
Os economistas pró-Estado defendiam a desvalorizção do real, com vistas a tornar mais competitivos internacionalmente os preços dos nossos produtos industriais e redução da taxa de juros, de modo a favorecer os investimentos produtivos, em detrimento dos especulativos.
Lula desdenhou do aumento da competitividade internacional de nossa economia como via para acelerar o crescimento econômico.
Desdenhou também do aumento do investimento.
O que ele fez?
Valeu-se do relativo sucesso que o país já vinha obtendo com o extraordinário aumento das vendas de nossos produtos primários, sobretudo para a China; isso, juntamente com a enorme disponibilidade de crédito no mercado internacional, nos garantiu uma folga confortável em nossas contas externas.
Foi essa folga que permitiu a Lula turbinar o mercado interno, com a expansão do Bolsa-Família, o aumento do crédito e o aumento real do salário-mínimo.
O crescimento do mercado interno fez o Brasil crescer mais rápido, sem aumento da nossa competitividade internacional e sem aumento significativo da taxa de investimento da economia, que eram as duas pré-condições, segundo os economistas, para a aceleração do crescimento.
Lula deixou os economistas falando sozinhos ou brigando uns contra os outros.
E, por um breve instante histórico, todos silenciaram para observar o sucesso de Lula, que havia prometido anos antes “o espetáculo extraordinário do crescimento”.
Mais: esse crescimento ocorreu com inclusão econômica e redução das desigualdades.
Tem até economista escrevendo artigo dizendo que Lula estava certo e que os economistas estavam errados.
Se a prática é o critério da verdade, o sucesso de Lula atesta que ele não estava totalmente errado.
Atesta também que ele é um supercraque do jogo político.
Tanto é que ele deixa a Presidência com índices impressionantes de aprovação popular.
Ocorre, porém, que os economistas também tinham razão.
E, me parece, tinham mais razão do que Lula.
O sucesso do país, inclusive na área social, não perdurará sem aumento da competitividade internacional e aumento da taxa de investimento.
Pior: cedo ou tarde, começaremos a perder boa parte do que conquistamos, em termos de crescimento e inclusão social.
Lula foi, portanto, tremendamente irresponsável ao desdenhar dos conselhos dos economistas e ao vender para o país a ideia de que está tudo dando certo.
Lula sacudiu a economia e a sociedade brasileira no curto prazo e garantiu seus 90% de aprovação.
Não deixa para Dilma um país; deixa, sim, um problemão.
Vejam bem que o nome Dilma é quase o substantivo dilema.
Ela hoje talvez se pergunte: faço uma gestão econômica que o Brasil requer e merece ou tento prolongar a mágica lulista?
Ou será que ela, da mesma forma que o minério de ferro e as commodities agropecuárias salvaram Lula, acha que o pré-sal irá salvá-la?
E, para você, o que falta dizer?

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Saudações e saudades

Grande abraço a todos os que, com seu carinho, seguem este blog ou deixam aqui seus comentários ou leem textos e comentários postados.
Essa é também uma forma de estarmos juntos ou, pelo menos, não tão distantes assim.

O pão da poesia

No Brasil, embora tenha havido um incremento significativo da leitura nos últimos anos, ainda se lê muito pouco.
Dessa pouco leitura, pouca é destinada à literatura.
Da pouca leitura destinada à literatura, pouquíssima é destinada à poesia.
Do pouquíssima leitura destinada à poesia, a maior parte se destina à poesia mais fácil.
E normalmente o leitor da poesia mais fácil está pouco interessado na poesia por ela mesma; o que ele busca ali é a ilustração eloquente e bela de um pensamento ou sentimento que ele já tem.
Pouquíssima relevância se reconhece ao poema como som e grafia dotados de personalidade própria, de um ser e dizer novo, que, com sua personalidade própria e novidade, intriga e reconfigura o mundo.
A rigor, pode-se dizer, no Brasil não se lê poesia.
Eu não vejo outra razão para ler poesia do que somente ler poesia.
Nesse sentido, eu diria, junto com um pensador francês, que a leitura da poesia é um ato intransitivo, um ato que se basta em si mesmo.
No entanto, com esse mesmo pensador francês, eu diria que essa intransitividade, quanto mais buscada e vivida, mais transborda para o todo da vida, tornando-a mais viva e, de certo modo, melhor.
Donde eu concluo: nós seríamos um povo melhor e um país melhor se lêssemos poesia; a poesia por ela mesma; poesia por poesia.
E, pra você, o que falta dizer?

Pisa na Filô

No Brasil, uma pessoa que faz o curso de Economia tem que estudar Celso Furtado.
Quem estuda Ciências Sociais precisa ler DaMatta, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro etc.
O estudante de História tem que passar por Caio Guilherme Mota, Bóris Fausto, Caio Prado Júnior etc.
Mas quem cursa Filosofia estuda qual autor brasileiro?
Há algum filósofo brasileiro de peso?
O Brasil tem Filosofia?
Quem se faz essas perguntas?
Quem sofre com a possibilidade de que a resposta a elas seja um tremendo NÃO?
E, pra você, o que falta dizer?